Aletheia e Veritas
(por Simone Prado)
VERDADE
( Carlos Drummond de Andrade)
A
porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.
Assim
não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E
sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os dois meios perfis não coincidiam.
voltava igualmente com meio perfil.
E os dois meios perfis não coincidiam.
Arrebentaram
a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram a um lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em duas metades,
diferentes uma da outra.
Chegaram a um lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em duas metades,
diferentes uma da outra.
Chegou-se
a discutir qual a metade mais bela.
As duas eram totalmente belas.
Mas carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
As duas eram totalmente belas.
Mas carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
Aletheia ou Veritas
Esses dois nomes citados acima são expressões referentes
à palavra Verdade. A primeira é de origem grega e a segunda , romana (latin).
Aletheia- uma verdade reconhecida pelos gregos
clássicos por ser fruto da análise da razão, do desvelamento, abrange o fato no seu todo: tudo deve passar pelo escrutínio da razão não deixando nada em oculto. Já Veritas
carrega consigo o significado de afirmação de um fato , aquilo que se
deixa revelar: não necessariamente o
fato em si, mas uma parte desse fato que pretende se consolidar.
“(...) onde a verdade esplendia
seus fogos.
Era dividida em duas metades,
diferentes uma da outra.”
Era dividida em duas metades,
diferentes uma da outra.”
Veritas seria algo como “ aquilo que se mostra”. A ciência
do Direito alinha-se a essa significação de verdade romana (Veritas). Uma verdade que se propõe discursiva, que trabalhará com a interpretação a seu favor. Então, a
afirmação dessa verdade em que uma parte dela se deixa revelar uma vez que, não necessariamente
é o fato em si, ela guarda consigo algo de ficção: porque não é o todo que
se mostra, mas uma parte. Essa parte que se mostra tentará, por meio de vários
argumentos, buscar no processo a estabilidade e a credibilidade. Essas ficções
( ou seja, qual a melhor ficção- ou verdade- se adapta a tal situação?), por
sua vez, tem a finalidade de harmonizar o processo, mesmo que essa suposta
estabilidade (estabilidade essa conquistada por meio da crença naquilo que se mostra como
verdade e os seus argumentos) possa vir a tomar para si num processo, por exemplo, algumas tecnicas semelhantes a da Psicologia ou Psiquiatria, por exemplo, para firmar-se
no Direito: um mise- en scêne para apresentar
a sua afirmação do fato( veritas) como
verdade e assim produzir as suas verdades jurídicas. Ela é uma parte, mas não a verdade em seu
todo. Não quero dizer, com isso, que a verdade no sentido Veritas se encontra no seu oculto, mas a sua pretensão e conquista em todo o seu processo de crença, persuasão e, por fim, credibilidade fazem com que a pretendida verdade acabe repousando sobre si.
“(...) As duas eram totalmente belas.
Mas carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
Mas carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
Revista Véritas- Puc-RS- 2002. Edição 185, pp 41 a 50